Efeitos da cobiça
Adalgisa
Nolêto Perna
Década de 40, tempo
conturbado pela Segunda guerra mundial. Coisas inéditas aconteciam no mundo
inteiro.
O Brasil também ressentia-se
dos efeitos daquela guerra e chegou a mandar jovens para lutarem ao lado das
forças aliadas.
No meio de tudo isso, surgem no norte de Goiás, hoje Tocantins, garimpos
de cristal, revolucionando o Brasil de norte a sul.
De todas as partes do nosso
país dirigiam-se pessoas para os garimpos, pensando na facilidade de ganhar
dinheiro, o que muitas vezes não acontecia.
O cristal estava valorizado
naquele tempo, e muitos chefes de família deixaram seus parentes queridos e
chegaram ao garimpo para ficarem ricos ou mais pobres do que eram.
Piaus era o maior dos
garimpos e foi lá que o Sr. Deocleciano decepcionado chorou e arrependeu-se
enquanto era tempo. Homem bom, moreno, de estatura média cabelos e olhos
castanhos, tipo do brasileiro nato. Era comerciante em uma cidade do Piaui.
Depois de combinar com sua
família, dirigiu-se a Piaus pensando em triplicar seu capital. ..Trazia um bom
dinheiro para investir no comércio. Ao chegar a Piaus mudou de ideia e entrou
de corpo e alma no garimpo, esquecendo-se do seu objetivo, mandou cavar catas,
(grandes buracos de onde eram tirados o cristal) na esperança de ficar rico, o
que não aconteceu.
O seu Dedé como era chamado
o Sr. Deocleciano abriu os olhos na hora certa mas metade do seu dinheiro já
tinha sido engolido por aquele garimpo que não tinha dó e nem piedade de
garimpeiro como ele.
Depois de muito pensar,
resolveu deixar o garimpo para morar em uma cidade tranquila, chamada de “Berço
da Cultura.”
Lá, apesar de muito só e de
perder de vez a sua família, sentiu-se em paz.
Não quis mais se casar nem
colocou em casa nenhuma mulher, Chegou a se lembrar muito pouco da sua
verdadeira família pela distância, pelo passar do tempo e pela falta de
notícias.
Não voltou para o Piauí para
não ter que enfrentar os seus e dizer que esteva mais pobre...
Ao chegar fez amizade com
muita gente, pois nas cidades pequenas todas as pessoas se conhecem.
O Sr. Deocleciano destacou
uma família pela solidariedade e delicadeza. Fez dela a sua própria família.
Seu Lupercino, D. Nancy e
seus dois filhos passaram a fazer parte da vida do novo habitante daquela
cidade.
Era no tempo em que existia
o curso ginasial. O prédio onde funcionava o ginásio ficava bem perto de um bar
que por sinal era o bar do Sr. Deocleciano que fez amizade com alunos,
professores e funcionários. Os fregueses eram ao mesmo tempo amigos e
reuniam-se para o bate papo de fim de tarde.
Como era bom o suco de limão
feito pelo Sr. Deocleciano... Além do suco, vendia salgadinhos, analgésicos,
vitaminas e às vezes uma caipirinha.
Passaram-se os anos e aquela
rotina só era quebrada quando a família amiga fazia um passeio e o Sr. Dedé era
convidado especial. Nessas ocasiões, o bar era fechado por uma tarde ou um dia.
Convidado para jantar com os
amigos o Sr. Deocleciano ficou à vontade para conversar e falar de sua
prosperidade no comércio.
O Sr. Lupercino
perguntou-lhe quais eram as suas pretensões daquela data em diante:
- Dedé, como você está
prosperando o que pretende fazer de agora em diante?
O Sr. Deocleciano, com a
alegria que lhe era peculiar, disse ao amigo:
- Pretendo trabalhar mais
alguns anos e depois quero me aposentar.
O amigo concordou, deu
forças e disse:
- Dedé, você do jeito que
vai são necessários apenas uns dois anos para alcançar o seu objetivo.
Conversaram muito, a par de
toda pequena fortuna que o amigo conquistara, despediram-se.
Já era tarde, todos dormiam,
apenas o Sr.Lupercino fumava um cigarro após outro e naquela cabeça de homem
sem Deus, começaram a se formar confusas ideias.
A sexta-feira amanheceu
triste, nublada, muito calor, trovões ao longe. Era o anúncio do final das águas.
O Sr. Deocleciano estava
confuso e com o coração apertado. Tivera sonhos conturbados e um deles era
prenúncio de maus acontecimentos.
Procurou a amiga dona Nancy
e falou do seu medo e da sua ansiedade. Dona Nancy acalmando-o disse-lhe:
- Coragem meu amigo, sonho é
bobagem e não quer dizer nada.
Algo de muito estranho
tomava conta daquele homem aparentemente tranquilo.
Dentre os amigos do dono do
bar havia um menino de uns dez anos, o Valdemar que todos os dias chegava bem
cedinho para vender limões para fazer o suco: marca registrada daquele bar.
Era mês de março, chovia
muito.
O Bar amanheceu fechado e os
vizinhos e amigos intrigados perguntaram: Será que o Sr. Deocleciano amanheceu
doente? Enquanto isso, na soleira da porta como em todos os dias, estava o
Valdemar com seu balde de limões amarelinhos. Cansado pela espera deixou que o
seu relógio marcasse 9 horas. Colocou o ouvido e os olhos na fechadura da
porta, não ouviu nenhum ruído nem ressonar e deu o alarme.
Em altos gritos clamava
Socorro! O meu amigo morreu! Mataram o meu amigo. Dentro da casa não há nenhum
sinal de vida.
A polícia foi chamada e
depois do arrombamento da porta, todos ficaram estarrecidos com o que viram. O
Sr. Deocleciano de cueca, com a cabeça esmagada estava caído no corredor em uma
poça de sangue.
Foram levados o seu dinheiro
e objetos de valor.
O medo se estampou em cada
fisionomia e aquela cidade passou a trancar suas portas às 18h para só abri-las
no outro dia às 7 horas da manhã.
Ninguém estava em paz e uns
diziam que o criminoso tinha se escondido no quarto, outros que ele estava
atrás da porta. Cada pessoa manifestava o seu pensamento aumentando a
insegurança daquele povo...
A cidade transformou-se em
inferno de lamentos e inseguranças.
A família mais amiga tomou
conta de tudo do funeral, das roupas, das despesas e chorar muito o amigo
perdido.
Muitas foram as flores e as
coroas que mandaram para o morto. No meio delas, destacava-se a maior e mais
bonita, com os seguintes dizeres. Saudades da família Lupercino que chora o
amigo que se foi...
Os murmúrios continuavam
cada um queria adivinhar o esconderijo do assassino.
D. Nancy tinha saudades do
amigo, inquietava-se com o grande mistério, a crueldade do ser humano mexeu com
a sua sensibilidade. Recorreu às autoridades, mandou vir detetives e saiu à rua
para ir à igreja pedir ajuda de S. Judas Tadeu.
Depois de três meses, o
crime continuava sem solução.
Da Capital chegou àquela
cidade o coronel Barbosa e sua equipe de detetives. No coronel Barbosa a população da cidade depositou toda a
esperança da solução daquele caso tão complicado.
Barbosa fez da cidade a sua
casa e começou a visitar residências, casas de comércio, escolas, bares e
hotéis. Procurou adquirir a confiança da sociedade para facilitar o seu
trabalho.
Era hora de chamar as
pessoas para deporem.
Começou pelos vizinhos do
bar e familiares do grande amigo.
As peças foram se encaixando
e era a vez de D. Nancy que através de suas pesquisas descobriu tudo e colaborou
com a polícia contando o que tinha descoberto.
O Sr. Lupercino foi chamado
para depor e apesar de se esquivar não teve como fugir.
O coronel já sabia de tudo
pelas suas pesquisas mas queria arrancar daquele homem frio a sua própria
confissão.
O Sr. Lupercino contou para
Barbosa que há muito vinha planejando tirar a vida do amigo, para ficar com seu
dinheiro.
O coronel com a autoridade que
lhe foi confiada e com a revolta por
tanta maldade, perguntou ao Sr. Luperciono – Você era tão amigo do Sr. Deocleciano
como teve coragem de tirar lhe a vida? Ele respondeu:
- No homem há sentimentos
bons e sentimentos maus, cabe a ele saber cultivar os bons.
O coronel Barbosa irritou-se
e disse – Você não respondeu a minha pergunta e eu vou fazê-la novamente – Por que
você matou o seu amigo?
- Por pura inveja. Saltei o
muro que dava da minha casa para o bar, bati na porta do quarto e ele acordou
assustado, sem querer falar. Ao ouvir minha voz, abriu a porta com alegria.
Perguntou se tudo estava bem comigo, respondi que sim mas a minha esposa estava
com forte dor de cabeça e queria um calmante.
Seu Dedé guardava os
remédios em cima da geladeira e ao virar as costas, foi agredido com uma
travanca (pedaço de pau), a mesma que
servia de ferrolho para a porta de quarto.
A cabeça do amigo ficou
esfacelada, não tendo nem tempo para pedir socorro.
Caiu agonizante e permaneceu
por várias horas em poça de sangue. Roubei os objetos de valor e o dinheiro, em
seguida, pulei o muro de volta ao meu quintal e acreditei que meu desejo tinha
se concretizado.
Depois do depoimento o Sr.
Lupercino foi declarado culpado e algemado seguiu para a penitenciária da
Capital.
A paz foi restabelecida, a
cidade voltou ao normal, livrou-se do medo que foi substituído pela confiança.
O coronel Barbosa estava
contente por ter desvendado aquele mistério, mas o seu coração batia
descompensadamente e ele murmurava:
Ao longo da minha vida
profissional, já descobri muitos crimes mas este foi o mais triste...
Comentários
Postar um comentário