Janelas

Imagem retirada da internet

Janelas
Estou perdendo a visão, já não enxergo de longe e de perto tenho dificuldades. Não sei o que está acontecendo comigo. Preciso procurar tratamento, é impossível viver sem enxergar.
Chego a um grande centro oftalmológico e encontro o médico para o qual fui recomendada. Minha cabeça está confusa e ele será minha tábua de salvação. Dá o diagnóstico: Catarata! Está na hora de operar. E explica o que aconteceu com o cristalino do meu olho, que tem de ser substituído por uma lente. Quase não ouço, estou perdida em pensamentos e perguntas. Será que dará resultado? Voltarei a enxergar?
A cirurgia foi feita, estou em fase de recuperação. No entanto, há algo diferente de todas as pessoas que fizeram a mesma cirurgia e com as quais converso.
Tenho de fazer alguma coisa, entre elas, falar com o médico. Ele me diz: tudo certo, enxergar é questão de pouco tempo. Estou esperançosa. Os livros que comprei já estão na estante aguardando a minha volta. Ao contrário do que esperava, minha visão está acabando. Enfio o pé em um buraco na rua e sou amparada para não cair. O desespero toma conta de mim, vejo apenas enormes manchas escuras. Maldigo-me, choro, esperneio. Já não tenho confiança no meu médico, mas é necessário procurá-lo. Problema na retina! Submeto-me a outra cirurgia.
Volto ao consultório para uma revisão, o médico está apavorado. Algo que eu não sei deu errado, mas ele se cala. Depois do susto, diz estar tudo certo. Decepciono-me e penso: às vezes é melhor a gente não entender o que se passa. Tenho visão dupla que me incomoda seriamente. Para tudo que olho há uma cópia, deixando-me atormentada.
O médico acalma-me e diz:
- Isso é normal, acaba com o tempo.
O choro passou a fazer parte da minha vida, a insônia é constante.
Com toda a frieza das pessoas que já se acostumaram com a dor alheia, o médico volta a falar:
- De cem pessoas que se submetem a essa cirurgia, só em uma não desaparece
A visão dupla, e a senhora foi uma delas.
O choro embarga a minha voz e eu permaneço calada.
Volto para casa, procuro adaptar-me à situação. Não dou conta. É preciso esquecer e é impossível, pois não posso andar com os olhos fechados.
Meus familiares não se conformam, meus filhos convidam-me a ir a  jornais e revistas denunciar o cirurgião. Consigo demovê-los da ideia, mas fica a revolta.
Dois anos depois as manchas reaparecem, já não enxergo. Tenho de mudar de médico. Perdi a confiança. Na mesma cidade, em outra clínica, um médico faz os exames e esclarece-me o que está acontecendo. A retina além de descolada está rasgada.  
Nova cirurgia, implante de silicone. Volto à clinica todos os meses de carro, de avião e de ônibus. Muita esperança. O tempo passa e com ele a desilusão. Depois de dois anos, o médico explica: Tudo o que eu tinha de fazer, já fiz. Vou recomendar-lhe a um especialista em córnea.
O médico muito simpático diz: a córnea está muito inflamada, vou receitar-lhe alguns colírios, a senhora deverá usá-los durante oito dias. É um teste para ver se escapo da cirurgia. Não houve melhora. Submeto-me à quinta cirurgia: transplante de córnea! Aguardo ansiosa mais um resultado. Depois de muitos meses, a notícias de que houve uma rejeição e é preciso um novo transplante. Descrente, pergunto ao médico quando poderei fazer a cirurgia, e ele; Pode ser logo ou daqui a seis meses. E ainda me disse: A senhora vai escolher: ou se acomodar ou revestir-se de coragem e fazer a cirurgia. Todo o meu ser está chorando, embora as lágrimas não apareçam. Digo que vou pensar e depois resolver. Sinto-me sem forças para continuar a luta. O meu poder de decisão está diminuindo, diminuindo...

Já vou! Meu marido me chama. Uma história comovente, mas infelizmente, já é noite e eu preciso fechar as janelas.
 Adalgisa Nolêto Perna


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